domingo, 14 de julho de 2013

Carpe Noctem rock...

Se rock é do Capeta, eu sou quase a madame Satã, não que eu seja uma exímia entendedora da coisa, mas me sinto sábia em relação a isso. Sabedoria no sentido lato da palavra, sabor. Saborear, saber o sabor da coisa, o sabor que o rock tem, o sabor que o rock me provoca, nos ouvidos, no corpo, na alma.
Alguns ficarão impertigados pela generalização e intimidade com que me refiro a esse estilo musical sem categorizá-lo como heavy, hard, death ou qualquer outro rótulo metido a besta, mas acordei com uma ressaca irreverente e oportuna de quem não comemora dia dos namorados, mas goza no dia do rock. Então que se fodam os entendedores obsessivos pau-no-cú!
Ontem, a data que já é interessante se intensificou com o sábado, 13 e aquela lua linda que domava a treva. Carpe Noctem para todos os malucos, alternativos, revoltosos e amantes dessa poesia musical.
Eu morfei loucamente na companhia ilustre dos clássicos que me rendem plenitude e na companhia mais ilustre ainda de um cúmplice que compartilha o mesmo sabor, quiçá maior ou mais intenso. Sorte a minha! Sorte a nossa...
Eu não saberia precisar quando exatamente, mas houve um momento em minha vida em que parei demarcar datas e feriados como eventos especiais, em detrimento de algo que realmente merece importância como as pessoas queridas, momentos interessantes e a vontade de fazer acontecer sem precisar de um feriado pra isso! Mas o dia do rock foi uma deliciosa exceção.

Algo de irresistível acontece comigo em relação ao rock desde que eu era pequena. Bizarrinha desde sempre, eu encarnei desde cedo a contravenção em pessoa ao gostar de Queen, Rollings Stones e Legião Urbana, enquanto era obrigada a ouvir o breganejo chato em todo evento familiar, quando não eram aqueles idiotinhas dos menudos. Graças ao bom Deus, não me traumatizou... muito!
Aí veio Sex Pistols, Ramones, The Clash, Exploited, e eu virei punk à minha maneira é claro! Atitude eu sempre tive, mais objeto de desejo mesmo era ser mais estranha, tipo o "lixo e a fúria"... mas não dava, família extremamente careta, já me olhava torto só por eu pensar diferente. O temperamento já era topetudo demais, tinha que me equilibrar.
O punk me ensinou que eu não tinha que gostar do que os outros gostam e essa lição a gente leva pra vida inteira, só que dentro!
Porque eu nunca pude ir senão aos inferninhos underground quando adquiri certa idade, mas não fico amargando resignação só porque não pude ir aos festivais rock in Rio, e nem fico morgando num estilo só. Fiquei arrebatada pelo metal, Korzus, Exodus, Nuclear Assault, Kreator, Slayer, Anthrax, Destruction e Overdose que fizeram parte de um vocabulário super metidinho em uma certa época da minha vida. Mas estamos falando de outro tempo, sem internet e sem amplo acesso musical às fontes. Eram difíceis e caras as cassetes e os discos, principalmente morando em Goianá - (a fazendinha que o facebook desconhece). Gente daqui que até hoje acha que estamos falando de vídeo game ao mencionar Joy Division.
Então acessível mesmo eram as bandas rock nacionais, delirava com todas especialmente Legião e Titãs - (que era o "bicho" na época, então não me olhe torto), mas confesso que só não me rendi ao chato do Gessinger, salvo piano bar e outras duas musiquinhas, acho Engenheiros do Hawaí um saco!
Eu acompanhava de olhos brilhantes aqueles festivais pela tevê que eram patrocinados por marcas gigantes de cigarro (o que na época era um luxo, a marca da vez era Hollywood!) e que trouxeram os Alice in Chains, Seal, Red Hot Clilli Peppers, Living Colours, Jesus Jones...
Tá certo que depois de degustar esse rock rasgado e rebelde de meados de 80, fiquei resistente quando bandas como Nirvana chegaram, chegando, com tudo. Mas foi inebriante também!

Com tudo isso! E nem citando metade dos ídolos e das coisas que gosto vou ensaiando uma conclusão cretina sobre o tema, simplesmente porque falar de rock me deixa sensível, emotiva. Assim como já não posso com algumas cancões que são proibidas por conta de seu conteúdo explosivo emocional: Bohemy Rapsody - Queen/Os barcos - Legião/Bittersweet sinphony - The Verve/Cry babe - Janis, entre outras... simplesmente não posso com elas, desaguam meu pranto. Recordações que se confundem com a própria vida!
Quando vem então uma data pra comemorar uma música que já se confunde com a minha história então, fico sem palavras, acabo portanto compilando esse desabafo safado e pouco literário.
Se o rock vale a pena? Eu não vou citar o célebre recorte de hora absurda in Fernando Pessoa, mas sim Morrissey com "There is a light that never goes out". Meus olhos ainda estão brilhando e não se apagam com o tempo, pelo contrário se iluminam mais!

Por Katyucha Ramos
Facebook: https://www.facebook.com/katyucha.ramos






segunda-feira, 8 de julho de 2013

Quem FICA?

Ouvi os clamores, preparai o vosso templo, que rufem os tambores! (Não, isso não é Jumanji. É Goiás.) 
__Veja, os seus almejados  visitantes de outrora estão de volta, doce Vila Boa! Salvem a nossa anfitriã vizinha.
Serão todos habitantes temporários de sua charmosa e barroca residência.
De onde vieram? 
Para onde voltarão? 
Eis a incógnita mais simpática dos últimos tempos numa cidade onde até os cachorros abonam a chegada dos cidadãos de temporada. Não são turistas, estão mesmo todos em casa, este é o sentimento que consome a todos.
Conjecturas, existem muitas. Uma amiga, no auge de seu esclarecedor momento filosófico sobre o evento (Só que não!), afirmou que despertaram todos de vossas catacumbas para reviver em Goiás. Tomei como uma afirmação poética! Até porque adoro a sonoridade da palavra 'catacumba' e porque também muitos realmente se renovam durante a ocasião.
Escrevo esta crônica na oportunidade de lavrar o registro informal , unânime entre os frequentadores com que sociabilizei, que fica o Festival Internacional de Cinema Ambiental a partir de então eleito como o evento idiossincrático mais adorável do nosso estado, e este ano com um tempero todo especial sabor: subversão. 
Nada como um bom festival para suscitar as aliterações do senso coletivo...A marcha das vadias e os manifestos 'fora-governador-que-estava-promovendo-a-festa', embora estivessem mais perdidos do que mobilizando, estenderam a larica gostosa da onda protestante que namora o país, lubrificando a união dos estranhos grupos frequentadores de festivais e ocasiões culturais interessantes.
É claro que sempre haverão os aproveitadores funk-jeans/sertanejo, facilmente identificados pela inabilidade em disfarçar a cara de "quando começa o batidão?" sem coragem de saírem da praça central onde há o acúmulo de semelhantes inábeis aguardando a mesma coisa e sem sequer desconfiar que existem museus, apresentações e colóquios, ostentando sempre a mesma aparência: mulheres de salto e vestido curto, numa cidade fria e com ruas de pedras. Os homens estilo "coxinha" vestidos como se fossem para a balada classe média goiana do vila-chato-mix. 
Mas todos torcemos para que talvez eles entendam até o final do encontro que o agradável do evento está nas vírgulas da cidade, nos becos de Cora, no caráter provinciano dos museus, nas lúgrubes e íngrimes vielas, no interlúdio das cenas comuns onde se beijam as diferenças todas: de idade, de raça, de cultura, de classe social. Louvemos!
O morro do macaco por exemplo não tem morro e nem macaco é um inferninho que atende os delírios de quem gosta de 'rastarpé' e cachaça. A bodega fantástica ostenta os delírios de quem ao som de um fado aprova o café com conhaque e os requintes burgueses todos de quem tem o paladar mais apurado. O moinho do trigo comercializa o orgasmo que vem na forma de um pudim. A praça do coreto abraça a todos como uma grande e carinhosa matrona, onde um esbarrão é motivo não de confusão, mas oportunidade para se fazer um novo amigo. E onde o tumulto vira oportunidade para celebrar. Muitos estilos, vários gostos, tantos opostos, um só lugar. Acaba virando festa, não pelo caráter massificante do legado pão e circo, mas porque tanta heterogenização ao invés de confusão acaba unificando. É uma matemática única.
Os shows são consequentemente no quintal de casa, ou no "terrero" como preferem chamar os anciões locais, um deleite à parte. O surto invocado de Arnaldo Antunes e o carisma boêmio de Paulínho e sua viola foram tocantes. A saber que as horas evaporam diferente enquanto em Goiás. E na partida a gente se despede com aquela carinha de quem se aparta de algo que gosta demais, sabendo que volta, ano que vem pra se encontrar de novo. Se encontrar. Encontrar-se.
Faz-se merda também? Sim. Mas é parte. Pelo direito de fazer merda! - Alguém por favor endosse a minha militância. Mas os maçons possuem uma máxima  de propagação sigilosa sob o batente de entrada de sua porta principal que diz, resumidamente: "Irmão, o que viu aqui, deixe aqui!" - e assim, avalizada pelos frequentadores assíduos do FICA, adapto a frase para: "Irmãos, o que viu, viveu, provou e gozou aqui, FICA aqui!" - portanto tem um pedacinho de loucura e irreverência minhas lá, assim como de muitos outros! Não mexa nelas não! A nostalgia me lembrará que devo voltar para buscá-la ano que vem! Fica tudo bem, quando acaba bem... e (to be continued...)

Mal escrito e compilado por Katyucha Ramos





segunda-feira, 1 de julho de 2013

Compartilhando a "chama"...

(Faça um favor a você mesmo e põe um jazz pra ler! Rs)
Quem fuma deve conhecer muito bem a sensação de ceder o seu fogo ao encontrar o semelhante esboçando compaixão e compartilhando a chama tão empaticamente. Para os viciados, os subjugados e escravos do cigarro, trata-se de  uma ação automática incólume e desimportante. Para os aficcionados, os amantes, os decadentes aliados aos delírios da nicotina talvez não!
Eu não fumo, mas confesso que reconheço o charme envolvido no exercício da tabacaria, que outrora fora muito mais glamourosa é bem verdade - os poetas que o digam! Mas continua atraente em muitos aspectos ainda.
Outro dia observei, me apartando do repúdio involuntário que o cheiro e o aspecto do ato me provoca, a cena entre duas pessoas do sexo oposto compartilhando a chama de seus respectivos cigarros, e achei provocativa.
A fotografia daquele momento cotidiano ficou registrado na minha cabeça como parte de um grupo seleto de imagens que representam o sentimento cinza libidinoso que Almodôvar sustenta tão bem em suas películas.
Gravado o momento na minha memória, continuei refletindo se havia por parte do casal a consciência da sedução presente naquela simples troca. Se a moça havia por vontade segura se inclinado quase se entregando sem palavra alguma para o outro e além de acender o cigarro, perceber se surgiria algum interesse? Se o rapaz, não oferecendo resistência alguma em compartilhar o seu fogo, encarou essa atitude como abertura para o flerte? Reparei que volta e meia se encaravam... Queria ter continuado por alí,  uma vez notada e sem fumar, há uma pressão quase palpável de exclusão, ninguém gosta de ser observado!


Imaginei por mim mesma o desenvolvimento, quis compor como mandava minha imaginação associando a outras ocasiões de mesmo tema:

Numa esquina agitada, na porta de um restaurante bar a moça já com o cigarro na boca, apalpa os bolsos sobre a cintura de seu casaco. Não se demora e surge o rapaz prestativo com o esqueiro em punho alcançando cuidadosamente a ponta de seu tabaco. Ela traga profundamente. A chama está acesa.
Satisfeita ela agradece:
__Obrigada!
E caminha três passos na direção oposta da calçada, permanecendo nela. O rapaz a observa atentamente, se aproxima devagar, coça o rosto, respira e apontando para o lugar onde a moça estava, desabafa:
__ Essa foi uma situação intensa, não acha?
Ela balança a cabeça desentendida:
__O quê?
Ele continua:
__Acabamos de compartilhar uma situação um pouco íntima, não acha?
__Íntima? Que intimidade?
__Agora a pouco, compartilhamos o nosso fogo! Foi bem íntimo! Ele disse com um sorriso malicioso.
__Se você diz! Ela rebateu irônica.
__Ah, você sabe do que eu estou falando, eu percebi quando as nossas mãos quase se tocaram, você levantou a cabeça, permitiu que eu me aproximasse, cruzamos os olhares! Ele insistiu.
A moça apenas sorria.
Ele aproveita para se aproximar ainda mais reforçando: __"Ficamos íntimos!".E Percebendo a insistência a garota provoca:
__Nossa! Isso tudo? Pare, agora eu estou me sentindo nua!
Ele resolve participar da troça:
__É. Eu causo mesmo esse efeito nas mulheres!
Ela riu debochadamente e ele se apressou em remendar:
__Não é em todas as mulheres! Só nas especiais... Não se assuste! Mas não ignore o que está acontecendo entre nós, está rolando uma química aqui e você tem que valorizar isso! Não é coisa superficial!
__Escuta, cara! - ela interrompe __Na verdade eu vim aqui só pra fumar um cigarro, relaxar e ficar na minha. Então, vamos deixar  pra próxima, ok!
__É, mas talvez não aconteça de novo, tá? Eu posso nunca mais ter essa chance novamente, quer dizer, talvez nunca mais o momento retorne, oportunidade perdida! Ele apela.
__Bom, sendo assim, quero que você saiba que sou casada e feliz! Ela rebate.
__Certo! Ele a encara. __E onde é que ele está? Ele te deixa aqui sozinha no escuro? Duvido?!
__É que ele não fuma! - ela parece empertigada.
__Ah, claro, claro! Então ele é um covarde que simplesmente te abandona com a sua doença mortal e te deixa sozinha sofrendo com seu vício torto enquanto fica seguro à distância, fingindo que a ama? Eu não respeito esse cara, não! Acho que ele é um covarde, um egoísta, mas acho mesmo que a qualquer hora esse cara vai se revelar 'duas caras'!
Ela sustenta um sorriso sem graça.
Ele cresce em argumentos irônicos:
__Olha eu vou dizer uma coisa que você pode não gostar, mas eu acho que você pode ter se casado com a pessoa errada!
Ela traga profundamente e devolve:
__Querido, eu não sei! "Será?" E mesmo que isso tudo fosse verdade, eu não contaria pra você, eu não te conheço, cara! Nós não somos 'exatamente' amigos só porque você gastou seu esqueiro comigo...
__Minha "chama", linda, não meu esqueiro! - Ele faz questão de enfatizar.
__Por falar nisso! ela provoca tirando outro cigarro do bolso e apontando para o esqueiro dele.
__Ah, então você precisa de mim outra vez! Você está indo embora e precisa do meu 'fogo'...
Ela balança a cabeça sem acreditar e se atravessa a rua...
Ele a segue, reforçando:
__Viu?! Milhares de partículas estão penetrando nossos cérebros agora, ele também acende outro cigarro. __Essas partículas estão estimulando nossos desejos sexuais mais involuntários. Não sei quanto a você, mas acho essa porra toda muito romântica! E depois de apreciar as tragadas profundas e maliciosas que você dá no seu cigarro eu posso lhe afirmar que eu estou na vanguarda dos homens que podem localizar o ponto G de uma mulher.
Ela finalmente se vira e se recosta num poste do outro lado da rua, região central da cidade.
__Você é muito generoso. Obrigada! Ela responde com um sorriso forçado.
__Que nada seria um prazer pra mim e principalmente pra você!
__E o que faz você pensar que eu não localizei meu ponto G?
Ele assume uma postura de professor, coloca o seu braço bem acima da cabeça dela e aponta:
__Pelo jeito que você segura o cigarro! Alto demais e apertado. - e demonstra - precisa abaixá-lo descê-lo até ele se acomodar e descansar no vão dos dedos... explicando com autonomia.
Ela parece entediada, mas ele continua...
__Você precisa relaxar, se segurar apertado desse jeito o corpo todo se restringe, o plexo se fecha, a pélvis fica tensa, o corpo se inibe. Ele declamou com ares de especialista.
Ao perceber o desinteresse dela, provocou:
__Desculpa, se te aborreço, imaginei que estaria interessada numa noite inesquecível. Mas tem estar preparada, precisa estar preparada! Você pode começar com uma caminhada, uma caminhada simples até meu apartamento aqui pertinho, no caminho eu te conto algumas piadas pra você relaxar, te acendo mais alguns cigarros, depois te ofereço uma taça de bourbon e te aqueço no meu ninho morno e romântico, assumindo o seu vício e você! No conforto do meu espaçoso loft. Então, a gente se despe e depois se beija...
Ela fuma enquanto ouve despreocupadamente. Ele continua, parece engajado:
__O beijo é a forma mais delicada de se relaxar, acho até que eu poderia beijá-la agora! E talvez beijar o seu pescoço suavemente até chegar no seu ouvido... eu posso te estimular com os mais belos poemas de amor.
Ela começa a rir freneticamente:
__Escuta, você é ator ou comediante, você é comediante?
Ele a encara orgulhoso e diz:
__Não, eu sou um escritor!
__Ah, escritor! Ela enfatiza com desdém.
Desafiado ele questiona, e quanto a você o que você faz?
__Programa. Ela responde sustentando o olhar.
__O quê? Ele fica sem entender. Como assim, o que significa exatamente isso?
__Significa que tem que pagar pra fazer sexo comigo! Ela rebate tranquilamente.
Ele fica sem graça,segura o cigarro só com a boca, corre as mãos para o bolso.  
Ela dá um cartão a ele:
__Gato,tem meu número e meu site aí. Tô ansiosa por uma ligação sua! Pra gente partilhar outro "momento íntimo"...
Ela sai rebolando de volta ao restaurante.



Na falta de moral da história, fica o desconselho: "O ego dos escritores é realmente do tamanho do pau que eles gostariam de ter!"

Escrito e compilado por Katyucha Ramos, inspirada no texto de Olivier Lecót - roteirista cinematográfico.