Acordei
procurando o que não tem lugar. O Domingo é o dia em que todas as estações se
encontram, mas pra mim, todas com gosto de outono.
Sua
ausência me inclina crepúsculo cinza e me rouba a libido de pecar sem
interregno. Fico rodeando o pão doce como mosca numa cúpula transparente. Eu te
vejo, mas não posso provar. Aí pra piorar, é Domingo.
Dos
Domingos...
Gosto
mais quando você me deixa dançar sua rotina pra não lembrar que a vida é
bélica.
Gosto
mais de passar as noites escutando os sons da sua varanda e flertando com as
nebulosas e as aquarelas do horizonte urbano de lá.
Gosto
mais da sua melodia vocal, do seu hálito de café, suas cervejas amanteigadas, sua
cachaça, seus discos, pufe, bateria, seu sorriso espaçoso, sua cabeça pelada,
sua caligrafia...
Dos
Domingos gosto mais dos dias que não o são!
Acontece
que hoje eu percebi que graças ao espaço que nos separa e a flacidez de um
Domingo pude valorar o quão é deliciosamente diferenciado estar e ser. Estou
mais ágil quando dividida, “as flores exalam mais o seu perfume quando estão
tristes” – corro, desperto cedo, fico atenta demais pra cuidar de me cuidar,
estou lépida, faceira, inquieta, a gente sozinha se movimenta pra não endurecer...
Assim
como sou mais inteira quando me reparto com você! Tudo se desenrola mais
intenso, cuidadoso, perfumado. Fico com o meu reparador ligado. As coisas ficam
editadas no modo destacado. A gente se enxerga. Sua companhia não é versão de
aplicativo que precisa ser atualizada pra rodar mais rápido. O amor é lento
mesmo! A gente junto, sabe disso...
A
gente que se sabe por não amar em troca de nudez e ainda sim se ama
obscenamente pra se devorar demorado...
A
gente que se sabe por amar antes e demasiado, a gente, que se denunciou desde o
primeiro dia sem cerimônia, por conhecer que quem procura as melhores palavras
pra dizer ainda não está certo de dizer.
A
gente que se sabe por algumas vezes ficar sem palavras e entender que a ausência delas é
também um idioma.
Eu
guardo reticências nas sobrancelhas de todo mundo que gosta de Domingo,
programa do Faustão, novela das oito, cerveja barata, fila pra entrar na balada
e música que repete demais o refrão, se preocupa com sujeira na hora da festa,
acha que é bobeira admirar estrela, guarda vontades pra ocasiões especiais, nunca
escreve o que pensa e principalmente morre de medo de expor a importância do
que sente.
Dos
Domingos eu permaneço querendo distância...
Da
passagem de ano, substância! Dos muitos e palpáveis desejos para o ano que se
inicia, quero continuar desaprendendo os limites e passando mais tempo com você reparando nas varandas...
Que bom que
foi num Domingo que você me roubou pra me devolver!
Escrito e
compilado por Katyucha Souza Ramos
Este texto
é dedicado ao Bruno Oliveira.